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Maria dos Céus

Uma Fábula Contemporânea

A atuação da bonequeira Paloma Barreto, aliada a efeitos visuais engenhosos e uma trilha sonora sutil, sustenta a narrativa silenciosa com precisão. 

 

Texto: Iasmin Feitosa

Maria dos Céus

 

O espetáculo Maria dos Céus, apresentado pela companhia Fios de Sombra no Centro Cultural UFG no último dia 7 de abril, é uma peça que chama atenção pela sofisticação técnica e sensibilidade temática. Com duração de 45 minutos, a montagem é voltada para crianças, mas entrega camadas que tocam também o público adulto. A história gira em torno de uma senhora solitária que mantém uma relação afetiva com uma árvore seca, sua companheira de vida. Apesar da proposta silenciosa, a montagem consegue manter o interesse do público, especialmente pela forma cuidadosa com que os elementos visuais e sonoros são utilizados.

PROTAGONISMO

A atriz e bonequeira Paloma Barreto realiza um trabalho impressionante. Ela não apenas manipula a protagonista com fluidez, como também insere pequenas expressões corporais — quase imperceptíveis — que completam a atuação. É como se, além de dar vida à boneca, ela também se colocasse como coadjuvante da cena, ajudando a ampliar as emoções transmitidas. Essa escolha traz mais camadas para a narrativa e reforça o peso dramático do espetáculo sem interferir diretamente na protagonista.

A trilha sonora e os efeitos especiais são outros destaques. O som é sutil, mas eficiente: acompanha os movimentos e marca momentos de transição de forma precisa, sem exageros. Os efeitos técnicos, como o da chuva e o florescer da árvore, surpreendem pela engenhosidade. Sabendo que o grupo levou quase oito anos para montar a peça, é compreensível a complexidade envolvida nessas soluções visuais. Em cena, tudo parece simples, mas a execução exige alto nível de preparo e sincronização.

OBJETIVO

Mesmo sendo voltado ao público infantil, Maria dos Céus trata de temas densos como solidão, velhice, espera e cuidado com o meio ambiente. Por isso, não é surpreendente que adultos presentes tenham se emocionado com a história e com os símbolos que ela carrega. A identificação com figuras familiares, como avós ou mães, é frequente e contribui para que a plateia adulta se envolva emocionalmente com a peça — algo confirmado também pela própria atriz em entrevistas.

PLATEIA

No entanto, a sessão foi prejudicada por parte do público. Um grupo grande de adolescentes de uma escola estava presente sem a devida supervisão e, em diversos momentos, interrompeu o clima de silêncio e contemplação que o espetáculo propõe. Embora seja natural que o público-alvo inclua jovens em idade escolar, a ausência de professores atentos à mediação tornou difícil a fruição para quem realmente tentava mergulhar na experiência. Isso acabou atrapalhando o envolvimento de muitos adultos na plateia.

Esse tipo de ruído externo não é culpa do espetáculo, mas evidencia como a preparação do público também faz parte do sucesso de uma apresentação. A proposta da companhia exige atenção, escuta e paciência — elementos que nem sempre estão presentes em grupos escolares desavisados. Seria importante, nesses casos, haver uma introdução pedagógica ao conteúdo da peça ou até mesmo limitar o acesso quando a mediação adequada não for garantida.

Maria dos Céus

REFLEXÃO

Mesmo com esses obstáculos, é inegável que o espetáculo é muito bem realizado. A construção visual é refinada, os movimentos da boneca são delicados e bem ensaiados, e o ritmo desacelerado da narrativa serve ao propósito de provocar reflexão. A presença do teatro de sombras, do silêncio e dos gestos repetitivos exige uma concentração rara hoje em dia, mas recompensa o espectador atento com uma experiência fora do padrão habitual do teatro infantil.

Maria dos Céus é uma peça que merece ser vista — especialmente por quem valoriza propostas estéticas menos óbvias. A sensibilidade do trabalho, o cuidado técnico e o desempenho de Paloma Barreto fazem da montagem um exemplo de teatro de animação bem pensado e bem executado. É uma pena que nem todo o público presente estivesse preparado para isso. Ainda assim, para quem conseguiu se desligar da agitação da plateia e se conectar com a cena, a experiência foi comovente e memorável.

 

 

IasminIasmin Feitosa é estudante de Jornalismo na Universidade Federal de Goiás e estagiária de comunicação no Centro Cultural UFG. Atua com produção de conteúdo e cobertura jornalística de eventos culturais.

 

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