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Bruno Costa celebra a força da voz coletiva em concerto no CCUFG

O regente, cantor e produtor cultural apresentou um programa de múltiplas paisagens sonoras no Festival da EMAC/UFG, unindo tradição, diversidade e emoção no palco do Teatro do CCUFG.

Por: Mateus dos Santos

 

Festivais Unificados EMAC 2025

O regente, cantor e produtor cultural Bruno Costa apresentou na noite do dia 16 de outubro, no Teatro do CCUFG, um concerto de rara sensibilidade, dedicado à diversidade das vozes e à força expressiva do canto coletivo. A apresentação integrou a programação dos Festivais Unificados da EMAC/UFG, reunindo o público em uma noite marcada por emoção e refinamento artístico. Reconhecido pelo trabalho à frente do Coro Osvaldo Lacerda, com o qual lançou em 2022 o álbum Cantos de Saudade, Bruno tem se destacado pela maneira com que alia rigor técnico, concepção estética e um profundo senso de comunicação humana através da música. Seu trabalho se caracteriza pela busca constante de diálogo entre o repertório tradicional e a criação contemporânea, entre o sagrado e o popular, entre o individual e o coletivo.

O programa apresentado no CCUFG conduziu o público por um verdadeiro mosaico de sonoridades e sentimentos. De Indodana, canto tradicional zulu que expressa lamento e esperança, ao Magnificat, texto de exaltação e gratidão, a música percorreu diferentes paisagens espirituais e culturais, revelando a amplitude simbólica da voz humana. Obras como Pie Jesu e Kumbaya trouxeram momentos de introspecção e delicadeza, enquanto Quien fuera como el jazmín explorou o lirismo da língua espanhola e o coro dos românticos da zarzuela Doña Francisquita acrescentou leveza e humor à sequência. O concerto se encerrou com Siyahamba, uma celebração vibrante do canto em movimento, marcada pela energia rítmica e pelo espírito coletivo que definiram toda a apresentação.

Discípulo de Naomi Munakata e Abel Rocha, Bruno Costa vem construindo uma trajetória notável no cenário coral brasileiro, reconhecido por sua visão integradora e pela capacidade de reunir artistas em torno de projetos criativos e consistentes. Atuou à frente de grupos como o Coral Paulistano, o Coro Acadêmico da Osesp e o Coral Jovem do Estado, além de coordenar os coros da ACAFI, em Indaiatuba. Desde 2023, dedica-se também à produção de óperas independentes pela Rede Cultural Carmina Nova, com montagens de Orfeu e Eurídice, Água, Azucarillos y Aguardiente e Orfeu no Inferno, reafirmando seu compromisso com a difusão e renovação da cena lírica. Atualmente, como maestro preparador do coro do Theatro São Pedro, Bruno reafirma sua convicção de que o canto coral é uma forma de arte capaz de unir sensibilidades, transformar coletivos e revelar, na soma das vozes, a essência do humano. E entrevistamos Bruno para saber um pouco sobre tudo que se passou no espetáculo.

bruno costaFoto: Assessoria/Divulgação

ENTREVISTA 

Mateus dos Santos: O programa do concerto percorre um caminho que vai do canto tradicional africano ao repertório sacro e à zarzuela. Como foi o processo de construção dessa narrativa musical tão diversa?

Bruno Costa: Para esta experiência compacta dentro do festival, com o coro, quis proporcionar aos alunos diferentes vivências dentro da música coral. O programa foi estruturado para oferecer desafios variados: começamos com peças de escrita musical mais complexa, que exigem atenção rigorosa à leitura, à afinação e à técnica; seguimos com obras de escrita mais simples, que pedem uma entrega emocional e uma busca interpretativa mais intensa; e finalizamos com uma zarzuela, um repertório operístico inteiramente vinculado à escolha interpretativa do coro. O objetivo era que os alunos experimentassem múltiplas dimensões do canto coral, desde a precisão técnica até a expressividade dramática, criando um percurso musical rico e diversificado dentro do tempo limitado do festival.

 

Mateus dos Santos: Você tem uma trajetória marcada por trabalhos corais de grande refinamento artístico. De que forma essa experiência influenciou a concepção deste espetáculo apresentado no CCUFG?


Bruno Costa: Minha trajetória influenciou diretamente a concepção deste espetáculo e a forma como escolhi o programa. A responsabilidade pelo resultado é compartilhada com os cantores: o maestro não apenas ensina, mas conta com o estudo, a preparação e a experiência de cada participante. Essa interação permite que todos os elementos do repertório sejam evidenciados. E esse processo em uma via de mão dupla, onde todos aprendem e contribuem, torna cada execução única. Uma música que eu possa ter feito com outro grupo será diferente neste, porque está contando com a contribuição e a experiência de cada integrante. A peça e a expectativa musical se moldam à realidade daquele grupo, fazendo com que seja possível realizar o mesmo repertório e obter resultados sempre muito únicos.

 

Mateus dos Santos: A proposta de reunir peças de diferentes origens e estilos parece também refletir uma mensagem sobre convivência e coletividade. Que ideia de “voz coletiva” você quis transmitir com este repertório?


Bruno Costa: A música funciona como fator de união entre os povos. No espaço do coro, diferenças de raça, idade, país de origem ou fé tornam-se secundárias diante de um objetivo comum. O trabalho coletivo mostra que podemos conviver e construir algo maior quando somamos nossas experiências e perspectivas distintas. No caso do coro, essa busca coletiva se traduz em um resultado musical mais amplo, mas também em uma experiência de conexão com o público. A soma das vozes individuais cria algo que transcende cada contribuição isolada, e é isso que chamo de “voz coletiva”: a força e a riqueza que emergem da união das diferenças em prol de um objetivo compartilhado.

 

Mateus dos Santos: Você vem se destacando também na produção de óperas independentes pela Rede Cultural Carmina Nova. Como essas experiências têm dialogado com sua atuação como regente e com projetos como este da EMAC/UFG?

Bruno Costa: Eu quis incluir uma peça do universo operístico porque a ópera oferece diversas lições importantes para o canto coral: cuidado com a vocalidade, atenção à técnica e à saúde vocal, e escolhas interpretativas conscientes para transmitir a mensagem da obra ao público. Além disso, acredito que o coro pode funcionar como uma porta de entrada para esse universo operístico, que dentro do nosso nicho de música clássica muitas vezes é o gênero mais distante: grande parte do repertório está em outros idiomas, a montagem é complexa e tanto artistas quanto público têm menos contato e vivência com ele, sentindo-se, muitas vezes, menos pertencentes. No trabalho que realizo com ópera pela Rede Cultural Carmina Nova, busco integrar cantores em formação com cantores diletantes, amadores ou que não têm a música como profissão, mostrando que a ópera pode ser um espaço de pertencimento para todos. Acreditamos que todos podem gostar e usufruir da ópera a partir do momento que têm acesso a ela e podem vivenciá-la. O coro funciona exatamente como essa porta de entrada: permite que as pessoas conheçam a ópera “fazendo”, experimentando o repertório e se conectando com ele. Por isso, quis levar uma pequena amostra desse universo para o festival, com uma peça que faz parte do repertório operístico, oferecendo aos participantes a oportunidade de descobrir que eles também podem fazer parte desse mundo.

 

ANÁLISE

O concerto apresentado por Bruno Costa no CCUFG foi um retrato eloquente da maturidade artística de um regente que entende o canto coral não apenas como técnica, mas como gesto humano e ato de comunhão. Em cena, Bruno construiu uma narrativa musical que atravessou geografias, idiomas e espiritualidades, mas sempre com unidade e propósito expressivo. A diversidade do repertório, longe de soar como colagem, revelou-se como um tecido contínuo de afetos e significados: do lamento ancestral de Indodana à luminosidade coletiva de Siyahamba, passando pelo lirismo de Quien fuera como el jazmín e pela espiritualidade introspectiva de Pie Jesu. Cada obra parecia abrir uma nova dimensão do sensível, conduzida por um gesto de regência firme, mas profundamente comunicativo. O maestro soube extrair dos cantores nuances de timbre, equilíbrio harmônico e clareza textual, sem perder o frescor emocional que define a melhor música coral.

Mais do que uma apresentação, a noite foi uma experiência de escuta compartilhada — um lembrete de que a arte coral é, em essência, uma metáfora sonora da convivência. Ao articular vozes, Bruno Costa reafirmou a potência transformadora do coletivo: a ideia de que o som só ganha sentido quando encontra o outro, quando se transforma em encontro. Nesse sentido, o concerto no CCUFG não apenas celebrou a diversidade musical, mas também reiterou a importância da arte como espaço de diálogo e humanidade.

O concerto de Bruno Costa integrou mais uma noite especial dos Festivais Unificados da EMAC/UFG, que seguem movimentando o Teatro do CCUFG com uma programação diversificada e aberta ao público. Ao longo dos próximos dias, o festival continua reunindo artistas, estudantes e grupos musicais em apresentações, oficinas e encontros que celebram a arte e a formação coletiva. O público é convidado a acompanhar as próximas atrações e vivenciar de perto a riqueza da produção artística da Escola de Música e Artes Cênicas da UFG — um espaço onde o som se transforma em aprendizado, emoção e partilha.

 

 

 

 

 

 

 

 

Mateus dos Santos Alves

Mateus dos Santos é estudante de Jornalismo na Universidade Federal de Goiás e estagiário de comunicação no Centro Cultural UFG. Atua com produção de conteúdo e cobertura jornalística de eventos culturais.

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